Nem tudo que é permitido nos convém - Eder Andrade

No mundo contemporâneo a falta de noção de limite, no comportamento de certas pessoas, está tomando proporções maiores do que imaginávamos. A deterioração das relações humanas está promovendo uma banalização no comportamento não somente dos jovens, mas também de muitas pessoas já adultas.

Não querendo ser moralista, apenas um observador histórico e sociológico, percebemos que as pessoas estão abusando do uso de artifícios para contornar sentimentos reprimidos, como álcool e diversos tipos de drogas. De uma certa forma isso já vem acontecendo há várias décadas. Mas infelizmente vem-se acentuando consideravelmente, decorrente de um desdobramento de uma crise socioeconômica que a Humanidade vem vivenciando. Não temos dúvida de que conviver numa sociedade competitiva exige muita firmeza e equilíbrio por parte do indivíduo, que acaba buscando nessas válvulas de escape uma liberação para seu estresse do dia a dia.

Porém a grande questão é o desdobramento a longo prazo no psiquismo dessas pessoas, que acabam se tornando dependentes das emoções provocadas por essas substâncias e mais suscetíveis a processos de influência e obsessão.

Quando alimentamos formas de pensamento doentias, com o objetivo prazeroso, acabamos nos tornando reféns dessas emoções e infelizmente ao longo dos anos fica cada vez mais difícil se libertar.

A reeducação das emoções pode ser o primeiro grande passo para nossa transformação atual, principalmente no que diz respeito à nossa conduta moral diante da vida. Saber que todos temos um livre-arbítrio não é a garantia de um processo de mudança de curto prazo.

No Espiritismo, chamamos de Reforma Íntima o movimento de autoconhecimento das nossas dificuldades, assim como o que pode ser feito para se modificar. Emmanuel por intermédio da mediunidade de Chico Xavier nos chama atenção para o seguinte:

Almas enfraquecidas, que tendes, muitas vezes, sentido sobre a fronte o sopro frio da adversidade, que tendes vertido muitos prantos nas jornadas difíceis em estradas de sofrimentos rudes, buscai na fé os vossos imperecíveis tesouros.1

 

Todos temos nossas dificuldades pessoais, porém nos momentos de grandes desafios, precisamos dar um testemunho de boa vontade, o que não é uma tarefa fácil, em uma sociedade com tantas questões de desigualdade, que parecem se acentuar com o tempo.

Apenas aqueles que buscam se capacitar moralmente conseguem entender o verdadeiro sentido do testemunho pessoal diante da vida, em um momento onde a transição planetária está promovendo um processo de separação do joio e do trigo, para aqueles que entendem o verdadeiro sentido da parábola bíblica na visão espírita.

Independente da capacitação pessoal de cada um de nós, para melhor interagir com a nossa caminhada, o Espírito André Luiz conversando com o instrutor Silas na obra Ação e Reação, psicografada por Chico Xavier, nos apresenta a seguinte questão para pensarmos:

Na mesma leira de terra dadivosa e neutra, quem acalenta a urtiga recolhe a urtiga que fere, e quem protege o jardim tem a flor que perfuma. O solo da vida é idêntico para nós todos. Não encontraremos aqui neste imenso palco de angústia almas simples e inocentes, mas sim criaturas que abusaram da inteligência e do poder, e que, voluntariamente surdas à prudência, se extraviaram nos abismos da loucura e da crueldade, do egoísmo e da ingratidão, fazendo-se temporariamente presas das criações mentais, insensatas e monstruosas, que para si mesmas teceram.2

O instrutor Silas deixa claro que colhemos o que plantamos e um dia teremos de dar conta das nossas escolhas à nossa consciência e aos nossos mentores que promoveram nosso retorno ao mundo material.

Emmanuel, percebendo nossas dificuldades pessoais em lidar com nossas fraquezas e arrastamentos, procurou incentivar aqueles que se sentem esmorecidos a não desistir da luta de transformação pessoal.

Não há forças miraculosas para os seres humanos, como não existem igualmente para nós. O livre-arbítrio relativo nunca é ab-rogado em todos nós; em conjunto, somos obrigados, em qualquer plano da vida, a trabalhar pelo nosso próprio adiantamento.1

O esforço pessoal deve ser feito por todos e os espíritas não são pessoas melhores e não estão remidos de passar pelos dissabores dessa sociedade doente.  Muito pelo contrário, devemos ser resilientes e determinados em lidar com os desafios do nosso dia a dia.

Suely Caldas em seu livro Transtornos Mentais, procurou fazer uma análise da sociedade, procurando correlacionar as questões espirituais e seus desdobramentos no mundo contemporâneo. Procurou mostrar as dificuldades dos encarnados em superarem seus desajustes, já que nem tudo pode ser atribuído à sociedade, porém ela acaba servindo como gatilho para trazer à tona nossas mazelas mais íntimas da alma para serem tratadas, quando diz:

A Justiça Divina é perfeita, portanto equânime, conforme o próprio Mestre Jesus asseverou, "a cada um segundo as suas obras." Nos códigos divinos não existem imperfeições, privilégios, castigos, perseguições ou vinganças - embora assim pense a maioria das criaturas, que atribuem a Deus, como punição impiedosa, as provações que enfrentam na vida terrena.3

Não podemos alegar que não sabíamos dos riscos para nossa saúde física e mental ao fazer uso de certas válvulas de escape, com a desculpa de que era uma necessidade iminente para superarmos uma crise momentânea.

A maturidade do senso moral é uma conquista individual de cada um de nós. A natureza não dá saltos e não podemos usufruir de um privilégio que não fizemos por merecer. Tudo é um processo, uma conquista pessoal nossa em direção a uma vida melhor.
 

Referências:

  1. Xavier, Francisco Cândido: Emmanuel; 1 - Almas Enfraquecidas: Necessidade do Esforço Próprio e Aos Enfraquecidos na Luta; FEB.
  2. Xavier, Francisco Cândido; Ação e Reação; 5 - Almas enfermiças; FEB.

Schubert, Suely Caldas; Transtornos Mentais; Parte I - Cap. 8 - Visão Espírita dos Transtornos Mentais; Minas Editora.



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