Cizânia - Rogério Coelho

Concilia-te depressa com o teu adversário enquanto  estás  no  caminho  com  ele.” Jesus.  (Mt., 5:25.)

Leopoldo Machado, polemista ferrenho, foi um homem talhado para o seu tempo!   Combativo, enérgico, porém jamais admitia contendas portas adentro da Doutrina Espírita. Divergir sim, dissentir jamais; era o seu lema! E quando se fazia inevitável a sua interferência junto a polêmicas entre confrades, nunca ia para as tribunas e jornais espíritas profligar[1] as pendências.   Dirigia-se através de correspondência particular diretamente à pessoa em causa, em perfeita sintonia com o estipulado por Jesus, conforme registro de Mateus[2]“ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão”.

Em mensagem psicografada pelo médium fluminense Raul Teixeira, no dia 19.08.91, na Sociedade Espírita Renovação em Curitiba (PR), Francisco Raitani (espírito) afirma: “sem possibilidade de fugirem das próprias responsabilidades estão aqueles que se valem das capacidades intelectuais para escrever as notas de infeliz conteúdo, em nome do periodismo espírita.

(...) Essa infeliz tarefa de divulgar o escândalo, (...) está encarquilhando[3] as mãos dos que grafam tais mensagens, quanto está obnubilando os centros do raciocínio dos seus autores, que deverão a seu tempo dar conta dos compromissos com equilíbrio, com justiça, com o progresso, desatendidos ou mal trabalhados”.

Sob o pseudônimo de “Um Espírito Amigo”, a suave mentora de Divaldo Franco, Joanna de Ângelis fez chegar às mãos de Allan Kardec uma página que ele não hesitou em inserir no terceiro livro básico da Codificação Espírita[4], cujo final pinçamos para nossas ilações: 

“(...) Ânimo trabalhadores! Tomai dos vossos arados e das vossas charruas; lavrai os vossos corações; arrancai deles a cizânia[5]; semeai a boa semente que o Senhor vos confia e o orvalho do Amor lhe fará produzir frutos da Caridade”.

Mais de cem anos depois, Joanna de Ângelis[6] volta, através da mediunidade de seu Tutelado Baiano, ratificando seu pensamento e banhando de luz o terreno sáfaro dos corações empedernidos[7] que se ergastulam nas escuras malhas da cizânia: “os lexicógrafos definem a cizânia como sendo “rixa, desarmonia, discórdia entre pessoas de amizade.

A cizânia constitui, pela sua própria estrutura, adversário ferino da obra de edificação do bem, onde quer que se manifeste. Parte integrante da personalidade humana, o espírito da cizânia facilmente se instala onde o homem se encontra.  Estimulada pelo egoísmo, distende com muitas possibilidades as suas tenazes, surpreendendo quantos incautos se permitem, por invigilância, trucidar.

Soez, persistente, contínua, a cizânia, ao manifestar-se, divide o corpo coletivo em falsos grupos de eleição, que logo se entredisputam primazia, estabelecendo o combate aguerrido e franco sob os disfarces da pusilanimidade ou da simulação.

A cizânia deve ser combatida frontalmente onde quer que o bem instaure o seu reinado.   Para tanto, torna-se necessário que cada membro ativo do grupo da ação nobilitante compreenda o impositivo da humildade.   Como a característica essencial da humildade é fazer-se identificar sempre carecente de aprimoramento, enquanto se luta por adquiri-la, as farpas da inveja não se cravam no seu corpo e as disputas infelizes não vicejam.  Ante o esforço para a fixação da humildade legítima, a cizânia não consegue proliferar. Isto porque é muito mais produtivo ser tachado de ingênuo ou tolo, porém pacífico e cordato, a dúctil e lúcido, no entanto, combativo e promovedor da discórdia.

(...) A cizânia nasce sempre no seio da vaidade que se faz nutrir pela presunção.

(...) Reage à cizânia, impedindo que ela te domine no pensar, no falar, a fim de que não se desdobre no agir... Examina o íntimo do Espírito para que as mentes geratrizes da cizânia, vitalizada pelo pretérito infeliz e corporificadas em grupos de perturbadores do Mundo Espiritual, não encontrem, na tua mente açulada, o campo para as cogitações da censura injustificada aos que não podem ser iguais a ti, quer estejam abaixo ou acima do teu nível de produtividade. Não olvides que ao mais esclarecido é exigida maior dose de tolerância, de compreensão e de misericórdia...

(...) Se desejas, realmente, como apregoas, que cresça o trabalho do Cristo, não faças perniciosa distinção entre os servidores; não sugiras separativismos; não confrontes mediante opiniões que criam ciúmes ou açulam vaidades vãs pelo elogio gratuito, indiscriminado e improcedente, porque todo coração é maleável à palavra da bajulação dourada como todo espírito é acessível à referência azeda da impiedade, ao licor embriagante da perversão.

Mantém, por tua vez, o compromisso da doação da palavra amiga e estimulante, quanto da advertência gentil, a fim de que possas prosseguir, seguro, na diretriz do equilíbrio.   Recorda que foi a cizânia dos homens que levou Jesus à cruz, através da invigilância de um companheiro enganado”.

Criaturas detentoras de alto índice de beligerância não fazem o perfil dos seguidores d`Aquele[8] que disse serem Seus discípulos reconhecidos por muito se amarem.  Portanto, Jesus esboçou com muita clareza e nitidez o perfil de Seus seguidores, perfil esse onde a mansuetude aparece em tonalidade exuberante.  Ele ainda dá o alerta[9]“Eu, porém, vos digo que quem quer que se puser em cólera contra seu irmão merecerá ser condenado no Juízo.” 

 


[1] - Tentar destruir com argumentos; atacar com palavras; criticar duramente; verberar, fustigar.

[2] - Mt.,18:15.

[3]- franzido da pele; ruga, prega.

[4] - KARDEC, Allan. O Evangelho Seg. o Espiritismo. 129.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2009, cap. XVIII, item 15.

[5]- Falta de harmonia; desavença, rixa, discórdia.

[6]- FRANCO, Divaldo. Florações Evangélicas. 4.ed. Salvador: LEAL, 2000, cap. 35.

[7]- Petrificado, inflexível, contumaz, insensível.

[8] - Jo., 13:35.

[9] - Mt., 5:22.



Comentário

0 Comentários