Ler, entender e atender - Rogério Coelho
Ouça quem tem ouvidos de ouvir; veja quem tem olhos de ver
“Quem lê, entenda.” (Mc., 13:14.) “Quem lê, atenda.” (Mc., 24:15.)
Uma das características do método de ensino de Jesus é levar a criatura a profundas reflexões, ao autoconhecimento e, consequentemente, promover ela mesma o seu próprio esclarecimento.
Não Lhe passava despercebido o detalhe da baixa estatura intelectual de Seus interlocutores, e a resposta-ensino era dosada de acordo com a capacidade de percepção de quantos Lhe recebiam a luz.
Estava o Mestre ciente de que a luz por demais intensa deslumbra e não clareia. Chegou mesmo a declarar que Ele ainda tinha muitas outras coisas para dizer, mas que não podíamos por hora suportar, deixando para o futuro “Consolador” a revelação e lembrança dessas coisas...
Em muitas ocasiões repetiu: “ouça quem tem ouvidos de ouvir; veja quem tem olhos de ver” e equivocam-se os analistas superficiais se apenas veem nessas palavras mero pleonasmo. Jesus apenas queria aguçar a atenção das criaturas para as nuanças mais delicadas do Seu ensino.
Certa feita, para tentá-lO, um doutor da lei perguntou[1]:
– “Mestre, que preciso fazer para possuir a vida eterna?”
Jesus responde perguntando:
– “Que é o que está escrito na lei?”
– “Que é o que lês?”
Observemos o duplo questionamento de Jesus sem dar ao menos tempo para a resposta entre um e outro.
Todas as Suas atitudes refletiam um propósito...
O único título que Ele admitiu receber foi o de Mestre. Assim, Suas palavras, repassadas de ternura e lucidez, embora muitas vezes graves, estavam sempre repletas de ensinamentos.
Com duas perguntas rápidas e simultâneas, Ele levou o doutor da lei a fazer uma análise de sua própria capacidade de apreensão. Em seguida, deu-lhe uma lição sobre quem é o nosso próximo e acerca da superioridade moral de um simples samaritano sobre o levita e o sacerdote negligentes, orgulhosos e desalmados (que liam, mas não entendiam e muito menos atendiam).
Não basta, portanto, ler, é preciso entender e atender!
Segundo Emmanuel, o nobre Mentor Espiritual de Chico Xavier: “(...) raríssimos são os leitores que buscam a realidade da vida. O próprio Evangelho tem sido para os imprevidentes e levianos vasto campo de observações pouco dignas... Quantos olhos passam por ele, apressados e inquietos, anotando deficiências da letra ou catalogando possíveis equívocos, a fim de espalharem sensacionalismo e perturbação? Alinham, com avidez, as contradições aparentes e tocam a malbaratar, com enorme desprezo pelo trabalho alheio, as plantas tenras e dadivosas da fé renovadora.
A recomendação de Jesus, no entanto, é infinitamente expressiva.
É razoável que a leitura do homem ignorante e animalizado represente conjunto de ignominiosas brincadeiras, mas o espírito de religiosidade precisa penetrar a leitura séria, com real atitude de elevação.
O problema do discípulo do Evangelho não é o de ler para alcançar novidades emotivas ou conhecer a Escritura para transformá-la em arena de esgrima intelectual, mas o de ler para atender a Deus, cumprindo-Lhe a Divina Vontade”.
[1] - BÍBLIA, N.T. Lucas. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1983, cap. 1, vers. 25 a 37.
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