Codependência, a doença que envolve a família - Arnaldo Divo R. de Camargo

Trabalhando em clínicas para tratamento de dependência química, escutamos muitos casos de pacientes e de seus familiares que também sofrem de uma doença, a codependência. A codependência ocorre quando um familiar não se conforma com a situação de seu parente que é usuário de álcool ou drogas e se desespera (a ponto de adoecer) tentando controlar o comportamento dele, em vão – nunca vai conseguir. No geral, em toda família onde há um dependente químico, há um ou mais codependentes, que adoecem com ele.

Imagine a situação de um pai ou uma mãe cuja filha ou filho, ao abusar de álcool ou outra droga, diz que vai cometer suicídio, em casa. Muitos parentes se desesperam, passam mal, têm de ser atendidos (também eles) no pronto-socorro.

A melhor atitude nesses casos é pedir ajuda a pessoas de confiança, ou ao corpo de bombeiros (número 193).

Amar não implica aceitar tudo. Porque não existe um “superpai” ou a “supermãe” dos filmes e da fantasia. Mãe é gente, tem vida própria e precisa ter amor-próprio e se cuidar. “Aos outros, só se pode amar”; modificar, apenas a si mesmo. Quem não se ama, quem está doente, precisa de ajuda terapêutica, psicológica, médica, e de internação.

O difícil é que normalmente os pais ficam sozinhos, porque os outros filhos, quase sempre, não se interessam pelo problema do irmão alcoólico ou adicto (escravo da cocaína, do crack, da maconha).

Tudo começa na prática de coisas simples… Primeiro as primeiras coisas.

Dizer o não! E não tendo medo do que o familiar vai fazer, porque isso é de responsabilidade dele. Muitos pais dizem sim quando queriam dizer não; para evitar a revolta, a insatisfação do ente querido, acabam concordando, dando dinheiro, carro, pagando contas etc. A recuperação começa por não arrumar a cama, não dar dinheiro, não aceitar desleixo e falta de higiene. A prática de colocar limites (dizer “não”) vai dar resistência para que o adicto busque ajuda ou vá cuidar da vida dele por conta própria (o que nem sempre acontece, porque ele está na zona de conforto com seu uso e abuso).

Tem lógica uma mãe ligar na clínica e, antes de falar com o filho, perguntar ao psicólogo ou terapeuta que está fazendo o atendimento prévio: “Meu menino está dormindo bem? Está se alimentando direitinho?”...

Que menino é este?! Um homem de 30 anos, muitas vezes... Ele já cresceu, mas, devido à doença das drogas, é tratado como criança porque fica dependente da família. A mãe teme pela sorte dele e tenta resolver uma coisa que não depende dela e sim do moço.

Para cada adicto, encontramos em torno de 8 a 12 familiares envolvidos, que muitas vezes adoecem tanto quanto o dependente. Adoecem do amor e vivem uma escravização afetiva. E acabam por virar reféns do dependente químico. Se é namorada ou cônjuge, ela faz o jogo do “amado”. O medo de perdê-lo ou de vê-lo distanciar-se (coisas que são pura ilusão, pois já vivem em mundos diferentes) deixa a família na situação de vítima, e o dependente, na de algoz. Isso também é um paradigma que precisa ser quebrado, vencendo o medo de tomar atitude. Novas atitudes geram crise, e é necessário tratamento psicológico, psiquiátrico e, às vezes, internação tanto de um como de outro (a família também pode ser internada).

A via da recuperação deve atingir a todos os envolvidos, simultaneamente. Senão, corre sério risco de não dar certo. Adictos manipuladores e famílias facilitadoras rompem o processo. Hoje em dia existem diversas formas de tratamento paralelo e simultâneo para ambos.

Inclusive as irmandades anônimas se desdobram para atender ambos os lados desta mesma moeda. Não existe justificativa. Quem não se trata é porque não quer sair da zona de conforto (mesmo que seja na desgraça em que se encontra).

A recuperação implica em coragem, ação e sacrifício! 


Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é editor da Editora EME.



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