Faculdade mediúnica - Rogério Coelho
Mediunidade não é patrimônio especial de grupos nem privilégios de castas
"(...) Não são os que gozam de saúde que precisam de médico". - Jesus. (Mt., 9:12)
Esta resposta de Jesus, que é ao mesmo tempo uma afirmativa, prende-se à interpelação eivada de perplexidade feita pelos fariseus aos discípulos de Jesus ao flagrarem o Mestre à mesa com publicanos e gente de má vida.
Causava-lhes espanto ver um homem virtuoso compartilhar a intimidade de homens indignos. Daí a resposta do Mestre. Mas hoje a pergunta dos fariseus ainda está no ar. Ela se dirige com as mesmas características de espanto e perplexidade quando se observa a mediunidade vicejar em terreno indigno, ou seja: pessoas de má vida, portadoras de potencial mediúnico. Ora, Kardec já esclareceu oportunamente, que a mediunidade[1] "(...) antes de tudo, é inerente a uma disposição orgânica, de que qualquer pessoa pode ser dotada", como é dotada de visão, audição e voz...
Como são raras as pessoas virtuosas, a grande maioria das criaturas seriam mudas se Deus só desse a faculdade da fala aos virtuosos; da mesma forma, se Ele concedesse somente aos mais dignos o dom da mediunidade, quem ousaria pretendê-lo? Pode parecer que tão preciosa faculdade devera ser atributo exclusivo dos de maior merecimento. Mas, na realidade, não é o que se dá”.
Coerentemente com o Mestre Lionês, Joanna de Ângelis[2] conceitua a mediunidade como “faculdade orgânica", que se encontra em quase todos os indivíduos, não constituindo patrimônio especial de grupos nem privilégios de castas; é inerente ao Espírito que dela se utiliza, encarnado ou desencarnado, para o ministério do intercâmbio entre diferentes esferas de evolução.
A mediunidade tem características próprias por meio das quais, quando acentuadas, facultam vigoroso intercâmbio entre os Espíritos encarnados e os desencarnados, entre as criaturas reciprocamente, bem como entre os próprios médiuns.
Segundo o ínclito Mestre Lionês1, "(...) a mediunidade é conferida sem distinção, a fim de que os Espíritos possam trazer a luz a todas as camadas, a todas as classes da sociedade, ao pobre como ao rico; aos retos para fortificá-los no bem; aos viciosos para corrigi-los. Não são esses últimos os doentes que necessitam de médico? Por que o privaria Deus, que não quer a morte do pecador, do socorro que o pode arrancar ao lameiro? Os bons Espíritos lhe vêm em auxílio e seus conselhos, dados diretamente, são de natureza a impressioná-lo de modo mais vivo, do que se os recebesse indiretamente. Deus, em Sua Bondade, para lhe poupar o trabalho de ir buscá-la longe, nas mãos lhe coloca a luz. Não será ele bem mais culpado, se não a quiser ver? Poderá desculpar-se com a sua ignorância, quando ele mesmo haja escrito com suas mãos, visto com seus próprios olhos e pronunciado com a própria boca a sua condenação? Se não aproveitar, será então punido pela perda ou pela perversão da faculdade que lhe fora outorgada e da qual, nesse caso, se aproveitam os maus Espíritos para o obsidiarem e enganarem, sem prejuízo das aflições reais com que Deus castiga os servidores indignos e os corações que o orgulho e o egoísmo endureceram.
A mediunidade não implica necessariamente relações habituais com os Espíritos Superiores. É apenas uma aptidão para servir de instrumento mais ou menos útil aos Espíritos, em geral. O bom médium, pois, não é aquele que se comunica facilmente com os Espíritos, mas aquele que é simpático aos bons Espíritos e somente deles tem assistência. Unicamente neste sentido é que a excelência das qualidades morais se torna onipotente sobre a mediunidade”.
Manoel Philomeno de Miranda esclarece[3]: "a mediunidade é expressão inerente ao homem, por cujo meio lhe é possível entrar em contato com outras faixas vibratórias, além e aquém daquelas que são captadas pelos seus equipamentos sensoriais.
(...) A mediunidade lutou e ainda luta contra as vãs tentativas de negar a veracidade do intercâmbio entre os encarnados e desencarnados. (...) A hipótese de que o subconsciente é o responsável pelas personificações parasitárias e anômalas foi a primeira levantada contra a mediunidade, dando surgimento às conceituações negativas apressadas, como patologias inerentes ao indivíduo, por cujo intermédio pareciam comunicar-se as almas dos mortos. A histeria, por sua vez, foi posta para coadjuvar tão aberrante diagnóstico, que teria fundamento fisiológico no polígono cerebral, de Wundt, encarregado de arquivar os conflitos e as frustrações que se corporificariam como estados de alienação, credora de tratamento especializado, em detrimento da possibilidade de comunicação espiritual.
Mais tarde o inconsciente de Freud, assumiu a responsabilidade por tal degradação da personalidade, que ocultava na sua gênese, qualquer tipo de distúrbio da libido. (...) Não afirmamos que sejam totalmente destituídas de respeito tais possibilidades, porquanto o fenômeno anímico é uma ocorrência presente, como se pode depreender, na estrutura do mediúnico, sem prejuízo para este. Todavia, sobrepondo-se a toda a gama de mecanismos automatistas do inconsciente e das interferências psíquicas outras, flui cristalina a mensagem dos Imortais, confirmando a sua realidade e oferecendo largo campo de estudos a respeito da vida e do homem em si mesmo. (...) Não procedem, desse modo, as alegações a respeito de que a mediunidade é miséria psicológica ou responsável pelos danos que afligem aquelas pessoas dotadas.
O conhecimento de tão peregrina função ou dom da vida auxilia o crescimento moral e o desenvolvimento psíquico, criando um clima de paz invejável, que passa a desfrutar aquele que a respeita e a utiliza corretamente.
Allan Kardec afirmou com altas razões que ela é manifestação anômala, às vezes, na personalidade humana, porque especial; jamais, porém, de natureza patológica, visto que “há médiuns de saúde robusta; os doentes o são por outras causas”.
De acordo com a direção que se lhe dê, pode a mediunidade converter-se em motivo de aprimoramento espiritual ou motivo de perturbação ou enfermidade. Se conduzido a precioso labor, o instrumento mediúnico, mediante segura constrição, irá adquirir vasto patrimônio de equilíbrio e iluminação ao mesmo tempo em que irá resgatando os compromissos negativos a que se encontra vinculado pelas pretéritas defecções.
Se a mediunidade, por outro lado, surge como impositivo provacional, ainda assim, o médium que lhe experimenta os efeitos, poderá granjear consideração e títulos beneméritos que lhe conferirão paz, desde que dilate o exercício da nobilitada missão a que se dedica.
“(...) Após a documentação Kardequiana que compõe a Codificação Espírita, a mediunidade abandonou as lendas e ficções, os florilégios do sobrenatural e do miraculoso, superando as difamações de que foi vítima, para ocupar o seu legítimo lugar, recebendo das modernas ciências psíquicas, psicológicas e parapsicológicas o respeito e o estudo que lhe desdobram os meios, contribuindo com abençoados recursos de que a Psiquiatria se pode utilizar, como outros ramos das Ciências, para solucionar um sem-número de problemas físicos, emocionais, psíquicos e sociais que afligem a moderna e atormentada sociedade.
Os exercícios da mediunidade com Jesus, isto é, na perfeita aplicação dos seus valores a benefício da criatura, em nome da Caridade, é que o ser atinge a plenitude das suas funções e faculdades, convertendo-se em celeiro de bênçãos, semeador da saúde espiritual e da paz nos diversos terrenos da vida humana na Terra”.
Kardec adverte[4]: "a mediunidade é coisa santa, e deve ser praticada santamente, religiosamente."
Assim procedendo, a faculdade mediúnica tornar-se-á fator de equilíbrio, esparzindo paz e harmonia onde quer que viceje, alterando sobremaneira as escuras paisagens do Planeta, fazendo raiar o Sol da esperança e do amor onde antes só havia desespero e trevas.
[1] - KARDEC, Allan. O Evangelho Seg. o Espiritismo. 125.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2006, cap. XXIV-12.
[2] - FRANCO, Divaldo. Estudos Espíritas. Rio [de Janeiro]: FEB, 1982, cap. 18.
[3] - FRANCO, Divaldo. Temas da Vida e da Morte. 3.ed. Rio: FEB, 1981, cap. “Psiquismo mediúnico”.
[4] - KARDEC, Allan. O Evangelho Seg. o Espiritismo. 125.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2006, cap. XXVI-10.
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