Disciplina mediúnica - Rogério Coelho

Lisonjeando o orgulho dos médiuns e apanhando-os pelo seu lado mais fraco  os Espíritos obsessores não tardam a subjugá-los.

“Os Espíritos dos profetas estão sujeitos ao profeta.” - Paulo.  (I Cor., 14:32.)


Está coberto de razão Pedro Jouty[1], ao afirmar: “o dom da mediunidade é tão antigo quanto o mundo”. Diz ainda mais: “os profetas eram médiuns. Os mistérios de Eleusis se fundavam na mediunidade. Os caldeus, os assírios tinham médiuns. Sócrates era dirigido por um Espírito que lhe inspirava admiráveis princípios da sua filosofia; ele ouvia-lhe a voz. Todos os povos tiveram seus médiuns e as inspirações de Joana d`Arc não eram mais do que as vozes dos Espíritos benfazejos que a dirigiam.”

Hoje, com as inapagáveis luzes do Espiritismo, podemos compreender muito melhor os mecanismos das interações parapsíquicas, reconhecendo-lhes a dimensão e importância. Na questão nº. 459 de “O Livro dos Espíritos” aprendemos que a influência dos Espíritos é tão significativa “que, de ordinário são eles que nos dirigem.” Essa fervilhante profusão da mediunidade, ora verificada, foi, aliás, profetizada há milênios por Joel, conforme consta no Velho Testamento[2]:   “derramarei o meu Espírito sobre toda carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos anciães terão visões, vossos mancebos terão sonhos; e também sobre os servos e as servas derramarei o meu Espírito.”

A mediunidade, inibida sob as impiedosas ordens da Igreja Católica nas chamas das fogueiras inquisitoriais na Idade Média, jamais desapareceu, mesmo quando mais tenazmente sufocada, haja vista a atuação de Swedenborg e seus adeptos que constituíram numerosa escola.   Hodiernamente, em cumprimento da profecia ela espraia-se sem possibilidades de cerceamentos da parte de quem quer que seja...

A Doutrina Espírita, consolidando a promessa de Jesus a respeito do “Consolador” que viria para “ensinar todas as coisas”, disciplinou a mediunidade, e quem a pratica fielmente sob a sua égide torna-se excelente trabalhador da Seara do Cristo a derramar as semente da vida Eterna na terra sáfara dos humanos corações.

 Hermínio C. Miranda afirma[3]: “o bom médium é aquele que transmite tão fielmente quanto possível o pensamento do comunicante, interferindo o mínimo que possa no que tem a dizer.”

 Com Allan Kardec aprendemos3: “os Espíritos procuram o intérprete que mais simpatize com eles e que lhes exprimam com mais exatidão os pensamentos.”

 Ratificando as assertivas de Kardec, Miranda esclarece2:  “(...) a mediunidade deve resultar, sempre, de uma equilibrada interação entre passividade e resistência, ou, para dizer de outra maneira, permitir, mas vigiar, coibindo abusos, sempre indesejáveis ou declaradamente perniciosos. Mas não apenas vigiar ou policiar as manifestações, como também não permitir que elas ocorram em qualquer lugar, a qualquer momento e de qualquer maneira...  Assim como o médium adequadamente treinado acaba por distinguir, naquilo que fala ou escreve,  o que são ideias próprias, pessoais, do que é alheio, também aprende, logo de início ou pouco mais adiante, a regulamentar o exercício de suas faculdades, recusando-se a passar o controle de seus dispositivos de manifestações quando entender que não é oportuno ou aconselhável fazê-lo.  Isto é particularmente desejável - indispensável mesmo - quando ele trabalha em grupo, cabendo-lhe impedir, a não ser sob condições reconhecidamente excepcionais, que uma Entidade lhe imponha uma manifestação enquanto ainda está com a palavra outro Espírito, através de outro médium.

Em suas primeiras lições de disciplina mediúnica, o Apóstolo Paulo - a maior autoridade em mediunidade nos tempos do Cristianismo primitivo - dizia que “o Espírito do médium deve estar sujeito ao médium”, e mais: só deve falar um de cada vez.

O médium, portanto, deve saber (e controlar) o momento de oferecer sua passividade e quando deve reagir com um bloqueio da resistência que iniba a manifestação indesejável e inoportuna.    Em suma: resistir é tão importante quanto ceder.   Cada uma dessas atitudes tem o seu momento certo”.

Aduz Kardec3: “(...) O médium jamais poderá perder de vista que a simpatia que lhe dispensam os bons Espíritos estará na razão direta de seus esforços por afastar os maus.   Persuadido de que a sua faculdade é um dom que só lhe foi outorgado para o bem, de nenhum modo procura prevalecer-se dela, nem apresentá-la como demonstração de mérito seu.  Aceita as boas comunicações, que lhe são transmitidas, como uma graça, de que lhe cumpre tornar-se cada vez mais digno, pela sua bondade, pela sua benevolência e pela sua modéstia. O primeiro se orgulha de suas relações com os Espíritos Superiores; este outro se humilha, por se considerar sempre abaixo desse favor.”

 Alerta Erasto[4]: “(...) O Espiritismo já está bastante espalhado entre os homens e já moralizou suficientemente os adeptos sinceros da sua santa doutrina, para que os Espíritos já não se vejam constrangidos a usar de maus instrumentos, de médiuns imperfeitos. Se, pois, agora, um médium, qualquer que ele seja, se tornar objeto de legítima suspeição, pelo seu proceder, pelos seus costumes, pelo seu orgulho, pela sua falta de amor e caridade, repeli, repeli suas comunicações, porquanto aí estará uma serpente oculta entre as ervas.”

Atentemos para as ponderadas informações e recomendações de vários Espíritos Amigos insertas em “O Livro dos Médiuns”1: “(...) nunca me cansarei de recomendar-vos que vos confieis ao vosso anjo guardião, para que vos ajude a estar sempre em guarda contra o vosso mais cruel inimigo: o orgulho. Quando quiserdes receber comunicações de bons Espíritos, importa vos prepareis para esse favor pelo recolhimento, por intenções puras e pelo desejo de fazer o bem, tendo em vista o progresso geral.

Que, dentre vós, o médium que não se sinta com forças para perseverar no ensino espírita, se abstenha; porquanto, não fazendo proveitosa a luz que ilumina, será menos escusável do que outro qualquer e terá que expiar a sua cegueira. Deus lhes outorgou a faculdade mediúnica, para que auxiliem a propagação da verdade e não para que trafiquem com ela.

Não é racional se suponha que Espíritos bons possam auxiliar quem vise satisfazer ao orgulho, ou à ambição.  Deus permite que eles se comuniquem com os homens para os tirarem do paul terrestre e não para servirem de instrumentos às paixões mundanas.  Logo, não pode Ele ver com bons olhos os que desviam do seu verdadeiro objetivo o dom que lhes concedeu e vos asseguro que esses serão punidos, mesmo aí nesse mundo, pelas mais amargas decepções.

Todos os médiuns são - incontestavelmente - chamados a servir à causa do Espiritismo, na medida das suas faculdades, mas bem poucos há que não se deixem prender nas armadilhas do amor próprio.   É uma pedra de toque, que raramente deixa de produzir efeitos negativos.   Assim é que, nos primeiros tempos da sua mediunidade, muitos se julgam fadados a obter coisas superiores e predestinados a grandes missões. Os que sucumbem a essa vaidosa esperança, (e grande é o número deles), se tornam presas de Espíritos obsessores, que não tardam a subjugá-los, lisonjeando-lhes o orgulho e apanhando-os pelo seu lado vulnerável, mais fraco: a empáfia e a vaidade.   Quanto mais pretenderem elevar-se, tanto mais ridícula lhes será a queda, quando não desastrosa.

Persuadam-se bem (os médiuns) de que, na esfera modesta e obscura onde se acham colocados, podem prestar grandes serviços, auxiliando a conversão dos incrédulos, prodigalizando consolações aos aflitos.   Se daí deverem sair, serão conduzidos por mão invisível, que lhes preparará os caminhos, e serão postos em evidência, por assim dizer, a seu mau grado.”

Lembremo-nos das palavras de Jesus registradas por Mateus, no capítulo vinte e três, versículo doze: “qualquer pois, que se exalçar, será humilhado; e aquele que se  humilhar será exalçado.”

 


[1] - KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 71.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, cap. XXXI, X a XV.

[2] - Joel, 2:28 e 29.

[3] - MIRANDA, H.C. Diversidade dos Carismas.  Capítulo II, item 24, 1º. Volume

[4] - KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 71.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, cap. XX.



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