As companhias e os apagões dos que se drogam - Arnaldo D. R. de Camargo

A Editora EME acabou de publicar uma nova tradução do livro de origem francesa, O Céu e o Inferno, em que espíritos de santos e filósofos relatam suas experiências pós-morte de felicidade e bem-estar, sem estarem em um lugar definido, mas em suas consciências. A obra traz também depoimentos dos desgraçados no Além.

Um deles evocado, que se identificou como “um boêmio”, é altamente instrutivo em sua fala. Depois de confessar os abusos praticados e lastimar a própria sorte, esse espírito passou conselhos aos homens, para que não se deixassem escravizar pelas paixões deste mundo.

Sua confissão foi seguida pelas instruções de um sábio, guia da médium: “A influência da matéria os acompanha no além-túmulo, sem que a morte ponha fim aos apetites que seus olhos, tão limitados quanto na Terra, buscam em vão satisfazer. (...) É necessário, então, que vivam nessa tortura moral, até que, vencidos pelo cansaço, decidem erguer os olhos para Deus”.

Pela lei de sintonia, os afins se atraem e se comprazem nos gostos. E os bebedores inveterados normalmente são acompanhados no vício por espíritos que também se entretêm naquela preferência. Álcool também é droga.

Um dos fatos mais corriqueiros dos que bebem é não se lembrar no outro dia do que fizeram e se desculpar por ter perdido o controle e bebido demais.

São os chamados apagões de memória (ou, no termo médico, “blackout alcoólico”): refere-se à perda temporária de memória que é causada pelo consumo excessivo de bebida. Esta amnésia alcoólica é causada por um dano que o álcool faz no sistema nervoso central, que leva ao esquecimento do que aconteceu durante o tempo da bebedeira.

Temos tido oportunidade de ver e ouvir diversas experiências a esse respeito, mas vamos trazer um aqui, anônimo, que nos deu autorização. O rapaz, quando começava a beber, bebia até realmente apagar a consciência (até dormir). E, no outro dia, alegava não se lembrar do que tinha feito; muitos não acreditavam, e não acreditam até hoje; como ele, outros usuários relatam o mesmo sintoma.

Uma vez, morando numa república com amigos, foi acordado no meio da manhã por uma amiga assustada, que acabara de ver o carro “dele” (na verdade, que tinha pegado dos pais) “estacionado de través” na calçada, em meio a uma avenida muito movimentada da cidade de São Paulo. Ainda tonto da bebedeira do dia anterior, desceu correndo para arrumar o carro (se ainda não tivesse sido guinchado): só que não lembrava onde havia parado!

Demorou quase meia hora até encontrá-lo...

Cada um de nós elege os tipos de experiências que, nessa vida, escolhe trilhar. A harmonia ou discórdia, o estudo ou o vício (dependência de álcool ou outras drogas), procurar um emprego ou se apropriar dos bens do próximo e, às vezes, da própria família, buscar o caminho da corrigenda ou dos enganos,

Somos todos livres nas ações, e depois dos frutos vêm as colheitas, quando no bem a consciência em paz, o paraíso dentro da alma, quando no mau caminho ocorrem as cobranças e as corrigendas, os débitos vencem e resgates chegam, na lei de causa e efeito, onde enfrentamos nossa redenção.

Devemos respeitar o livre-arbítrio das pessoas, suas vontades e vocações.

No caso das pessoas que desenvolvem a doença da dependência química, elas perdem a razão e a capacidade de escolha, e a família, pensando na saúde, no bem e na recuperação, devem propor um tratamento involuntário.

E no caso daqueles que estão marginalizados, na rua, a promotoria, em acordo com a secretaria da saúde e o juiz, pode fazer a internação compulsória, porque o adicto por si só não consegue se ajudar e vai morrer na dor.

Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é editor da Editora EME.



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