Três raposinhas inteligentes

Compenetrada estava eu, no computador, organizando as apresentações para o Encontro dos Grupos Espíritas da Irlanda, que aconteceu no dia 21 de setembro. O dia fora super-repleto de tarefas, após o evento abençoado, acontecido semanas antes em Wegimont, na Bélgica, no final de semana de 5, 6 e 7 de setembro. Esse evento apoiado pela União Espírita Belga teve uma particularidade superespecial.  Nós, os trabalhadores espíritas de diversos países europeus, ficamos imersos esses 3 dias com alojamento, alimentação e salas dos workshops, no mesmo prédio do antigo castelo, sem precisar sair do local. Isso facilitou o entrosamento, a fraternidade, a troca de informações entre todos, sem deixar ninguém de fora, pois a maioria não fala português, e alguns nunca estiveram no Brasil. Nossa ponte de comunicação tem sido o idioma inglês, como foi o grego, como foi o latim, como foi o francês, em tempos evos.

Já avancei na descrição, mas voltando ao computador, onde estava totalmente absorvida por terminar as tarefas, não me dei conta do horário avançado. Não me dei conta sequer se tinha almoçado. Já estava escuro, apesar de anoitecer mais tarde neste período do ano no hemisfério norte.

Um chamamento diferente me despertou do hipnótico computador. Parei, ouvi de novo, e os uivos vinham de sob a janela atrás de mim. Levantei a cabeça em direção ao relógio redondo de madeira clarinha, na parede de minha sala, bem em frente aos meus olhos... Pensei... não acredito que já são 22h20 horas e sorri comigo mesma. Pensei, pensei e pensei.. ó meu Deus, esqueci-me das raposinhas...

O leitor deve estar curioso, o que a Elsa faz com as raposas sob a sua janela?

Explico: Desde alguns anos, uma família de raposinhas, ao chegar o verão de Londres, sai à noite de suas tocas em busca de alimentos. Meu prédio é rodeado de parques e jardins, com altos arbustos e roseiras de cores mil. As raposas mantêm seus túneis, suas tocas e não são perturbadas durante o dia pelos cachorros que passeiam com seus donos, neste jardim interno... Ambos, dono e cão, fazem os exercícios de caminhada. 

Acostumei-me a vê-las ao chegar em casa, ao redor das 21h30, após as tarefas nas casas espíritas.

Como está calor desde maio, abro as janelas e me deparo com elas correndo no jardim de trás. Tenho por costume, ao chegar em casa, abrir as janelas e jogar um pouco de alimentos a elas, e assim fui fazendo todas as noites. Acostumei-me a me comunicar com elas, com um ruído, um estalido, como se chama um cachorrinho... Após atenderem, recebiam um pedaço de presunto, de frango, ou o que eu tivesse na geladeira. Assim, por volta das 22 horas, todas as noites, elas continuam aparecendo. 

Como hospedo em casa amigas palestrantes, abro as janelas e as amigas veem as raposas. Julia Nezu, da USE-Regional São Paulo, aqui esteve e ficou encantada com as “bichinhas”. São lindas, grandes, e têm filhotes... Agora, vez ou outra, eu tiro fotos delas e envio à Julia. Como pode haver raposas numa cidade como Londres? Pode sim. A prova é que elas aqui residem há anos. Graças a Deus, a caça às raposas é ilegal no Reino Unido.

Pois bem, nesta noite, após um dia inteiro sem sair do computador, dada a necessidade de organizar documentos e palestras que deverei estar levando para México, Espanha, Maide-nhead etc., as horas “voaram”.   Acreditem que as danadinhas me chamaram? E eu fui à janela e tive de rir muito, sozinha aqui. Elas embaixo, as três, olhando diretamente para minha janela, esperavam algo para comer. Aprendem muito fácil, como nos ensinou Pavlov, a nossa comunicação com os animais. Dei-me conta que eu, não tendo almoçado, também não tinha nada na geladeira, além de pão congelado.

Logicamente não aprovaram o pão, e nada mais eu tinha a oferecer naquela noite. Lembrei-me de Antoine de Saint-Exupéry, no livro O Pequeno Príncipe: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Assim, meditando na natureza, na vida, nas mil possibilidades de mantermos a mente ocupada, focando na beleza da Criação, não damos espaço à depressão, ao desânimo, aos maus pensamentos, e sempre tentamos fazer o melhor em terras de raposinhas, e em terras de além-mar.

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Elsa Rossi, escritora e palestrante espírita brasileira radicada em Londres, é membro da Comissão Executiva do Conselho Espírita Internacional (CEI) e coordenadora da BUSS-British Union of Spiritist Societies.



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